O CV ”à la française” – como construir um CV para o mercado francês
- Jornada de Coaching
- 11 de out. de 2018
- 5 min de leitura

A França está vivendo uma grande transição. De um lado, toda a força cultural e histórica de um país muito antigo, que um dia já foi o mais influente do planeta e que, por isso mesmo, é muito apegado às suas tradições. De outro, uma nação que há pouco elegeu o presidente mais novo do mundo, com 39 anos no ano da eleição (há outros mais novos que ele em idade, mas não eleitos, como Kim Jong-un, 34, da Coréia do Norte), e que está tentando se tornar um país economicamente mais eficaz e financeiramente mais forte (existe, por exemplo, um movimento para se diminuir o número de funcionários públicos hoje existentes na proporção de 1 para cada 10 habitantes, o dobro do existente na Alemanha). Não sou nem pró nem contra o partido de Macron, não me interesso por política e meu objetivo aqui é apenas iniciar essa conversa sobre CVs mostrando que coisas práticas de nossa vida – como o curriculum – são diretamente influenciadas pelas grandes mudanças na sociedade.
Tendo isso em mente, o jeito de identificar e recrutar candidatos na França está mudando aos poucos. Ainda muito lentamente, mas está. Em 2005, por exemplo, foi criado na França o Viadeo, com a intenção de ser o substituto local do LinkedIn. Não deu certo. A cada dia que passa, mais executivos voltam para o LinkedIn, e consultorias e especialistas em redes sociais dão aulas sobre como usar o LinkedIn para promover seus relacionamentos profissionais – sim, há milhões de profissionais franceses que ainda não sabem usar as redes sociais para fins de carreira.
Quanto ao CV, não há muito consenso entre os recrutadores e headhunters sobre qual o modelo ideal. Há pouco tempo, todos que quisessem ter uma chance no mercado de trabalho europeu deveriam montar seu CV de acordo com as normas da Europass, uma plataforma que unificava os dados de profissionais dentro da zona do Euro. E a França adotava esse padrão em larga escala. Hoje, várias empresas já não a usam mais, pois o modelo é muito rígido e não consegue diferenciar muito bem um profissional do outro.
É importante entendermos que um CV francês não é igual ao CV que fazemos nos EUA ou no Brasil. Nos EUA, por exemplo, muitos sugerem que você não mencione sua idade e nem coloque sua foto, pois isso poderia levar a alguma espécie de preconceito, segundo a cultura local. No Brasil, muitas empresas e headhunters ainda aceitam analisar CVs com 2 ou 3 páginas. Na França é diferente.
Abaixo, estão algumas dicas. Tive contato com consultorias e recrutadores que prestam serviços ao Pôle Emploi, o órgão do governo francês responsável pelo suporte às pessoas sem emprego, seja com ajuda financeira, seja na aproximação entre elas e as empresas. Além disso, trabalho com profissionais franceses de vários setores que querem melhor se preparar para encontrar o trabalho que lhes convém. A lista abaixo é oriunda dessa experiência. Ela não é exaustiva, pois há sempre algo a ser acrescentado pelos especialistas, mas já é um bom começo para quem quer causar uma boa impressão.
As áreas do CV
Um CV francês tem quase sempre as mesmas seções: Dados Pessoais, Título (que, na verdade, é o seu objetivo profissional neste momento), Competências, Experiências, Formação e Áreas de interesse. Falarei, aqui, de algumas delas.
O tamanho
Nada de ultrapassar 1 folha! Dizem que um recrutador leva entre 6 e 10 segundos para “scanear” com os olhos o seu CV. Dependendo do seu nível de senioridade, é difícil de compilar tantos anos de experiência em apenas 1 folha. Pensando nisso, alguns profissionais de RH sugerem fazer um “tableau des compétences”. Isso nada mais é do que uma folha (que pode ser enviada em anexo ao CV) com uma descrição mais completa de suas atividades em cada empresa por onde passou. Assim, dizem, a diagramação do CV não fica comprometida.
Falando de forma
Alguns recrutadores gostam de CV em cores – folha colorida, ou ícones coloridos ao longo do texto – mas hoje em dia os especialistas começam a recomendar que você não faça isso para não errar. A mesma coisa com relação ao uso de várias tipografias diferentes ou símbolos gráficos e outros estilismos. A não ser, é claro, que isso tenha a ver com sua área de atuação e já seja um elemento diferenciador para o seu trabalho.
Os dados pessoais
Aqui devem entrar não apenas nome completo, e-mail e telefone, mas também endereço, idade e foto! Sim, os franceses querem logo ver o rosto da pessoa por trás do CV. Aqui vale a regra para todas as fotos profissionais: enquadramento considerando uma parte do tórax para cima, vestimenta adequada, maquiagem discreta, ligeiro sorriso. Adicionar suas páginas pessoais de LinkedIn, Viadeo (mesmo que ele já não esteja “com essa bola toda”) e Facebook ou Instagram (se elas tiverem algo a ver com sua atividade profissional) também ajuda.
Título = objetivo profissional
Pouca gente sabe realmente fazer um bom título. Ele não deve ser específico demais (algo como gerente de exportação de agronegócios suínos), nem genérico demais (gestor administrativo). No primeiro caso, você pode acabar limitando a posição (gerência ou diretoria), além de restringir suas potenciais áreas de atuação (por que apenas suíno?) No segundo, o recrutador pode achar que você está “atirando para todos os lados”. É importante descrever seu objetivo profissional com poucas palavras, dando uma ideia do seu nível de senioridade e do campo no qual você quer trabalhar.
Competências
Colocadas em forma de lista, elas devem ser um sumário de seus talentos únicos e de suas áreas de expertise. Apesar do francês não ser tão objetivo como o americano, evite coisas genéricas como “ótimo trabalho em equipe” ou “rápida na tomada de decisão”. Essa lista pode e deve ser modificada de acordo com a posição para a qual você estiver postulando. Mencione as competências que forem úteis para lhe diferenciar em cada situação.
Experiência sem dados concretos? Nunca!
Sempre que possível, coloque dados concretos que tangibilizem suas realizações. Isso, inclusive, é válido em todo o mundo, não só na França. Aqui valem números absolutos, percentuais, posições em rankings, etc. E privilegie as mesmas palavras-chave que aparecem nos anúncios de trabalho que lhe interessam. Isso porque 95% das grandes empresas usam programas que rastreiam currículos e filtram e selecionam candidatos de acordo com as palavras-chave usadas.
Também existo fora do trabalho!
Os franceses valorizam muito a vida fora da empresa. Assim, a seção “áreas de interesse” é parte integrante e importante do CV. Coloque, aqui, hobbies, participação em grupos e associações, interesses particulares que você possa ter e que possam gerar um conteúdo espontâneo na hora da entrevista. E atenção: o trabalho voluntário é muito valorizado na França. Em 2016, o número de voluntários no país era estimado em 13 milhões, ¼ da população francesa (estimativa no site).
Caso alguém queira mais detalhes sobre algum tema específico voltado à criação de um bom CV, deixe um comentário e eu farei mais artigos sobre o assunto.
Stela Klein